segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Monólogo



Fala a Dama do Lago:

Dizem que os velhos dormem pouco devido à proximidade do descanso eterno, a mim, não é isso que me aflige. 
Aqui estou há milhares de anos e outros tantos passarei... Mas sim: estou velha e cansada. Tanto menos por mim como por sentir na alma a dor do mundo que aos meus olhos se desvanece. 
Assim, ergui-me das águas para contemplar a noite na beira do lago. 

E áquela hora brumosa entre a noite e o alvorecer, quando as folhas tremem com a brisa suave e os pássaros anunciam um novo dia, um raio de sol perpassou a superficie serena que havia deixado e entrevi o brilho da espada por entre as águas. 
Vi tudo de novo nesse clarão... As eras passadas e o porvir, civilizações destruidas, esquecidas, por destruir e esquecer... 
Voltei a sentir a mão segurar no punho da espada das estrelas quando foi lançada de novo a casa, enquanto aguarda um novo rei digno de lha entregar. 

Por detrás do escudo do nevoeiro, a verdade perdura, embora o Homem pareça empenhado em escondê-la... Que estranho sentir lágrimas correr numa face já feita de água... 
Ou serão as lagrimas de tantas dores que formaram o meu lago e a mim também? 
Ah, se eu ao menos pudesse... 
O que foi feito pelos Homens quase condenou o meu mundo e com ele toda a magia que encerra... Mas a habilidade de um alquimista e a magia de uma sacerdotisa poderão recuperar o que se perdeu, se a Senhora da Forja pegar no seu martelo uma outra vez. 

A esperança não morre...

SLL

Ser



Tu és...
e porque tu És, eu Sou...
porque tu És e eu Sou, Somos....
pela eternidade...

SLL

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Livro dos Amantes



I

Glorifiquei-te no eterno.
Eterno dentro de mim
fora de mim perecível.
Para que desses um sentido
a uma sede indefinível.

Para que desses um nome
à exactidão do instante
do fruto que cai na terra
sempre perpendicular
à humidade onde fica.

E o que acontece durante
na rapidez da descida
é a explicação da vida.

II

Harmonioso vulto que em mim se dilui.
Tu és o poema
e és a origem donde ele flui.
Intuito de ter. Intuito de amor
não compreendido.
Fica assim amor. Fica assim intuito.
Prometido.

III

Príncipe secreto da aventura
em meus olhos um dia começada e finita.
Onda de amargura numa água tranquila.
Flor insegura enlaçada no vento que a suporta.
Pássaro esquivo em meus ombros de aragem
reacendendo em cadência e em passagem
a lua que trazia e que apagou.

IV

Dá-me a tua mão por cima das horas.
Quero-te conciso.
Adão depois do paraíso
errando mais nítido à distância
onde te exalto porque te demoras.

V

Toma o meu corpo transparente
no que ultrapassa tua exigência taciturna
Dou-me arrepiando em tua face
uma aragem nocturna.

Vem contemplar nos meus olhos de vidente
a morte que procuras
nos braços que te possuem para além de ter-te.

Toma-me nesta pureza com ângulos de tragédia.
Fica naquele gosto a sangue
que tem por vezes a boca da inocência.

VI

Aumentámos a vida com palavras
água a correr num fundo tão vazio.
As vidas são histórias aumentadas.
Há que ser rio.

Passámos tanta vez naquela estrada
talvez a curva onde se ilude o mundo.
O amor é ser-se dono e não ter nada.
Mas pede tudo.

VII

Tu pedes-me a noção de ser concreta
num sorriso num gesto no que abstrai
a minha exactidão em estar repleta
do que mais fica quando de mim vai.

Tu pedes-me uma parcela de certeza
um desmentido do meu ser virtual
livre no resultado de pureza
da soma do meu bem e do meu mal.

Deixa-me assim ficar. E tu comigo
sem tempo na viagem de entender
o que persigo quando te persigo.

Deixa-me assim ficar no que consente
a minha alma no gosto de reter-te
essencial. Onde quer que te invente.

VIII

Eis-me sem explicações
crucificada em amor:
a boca o fruto e o sabor.

IX

Pusemos tanto azul nessa distância
ancorada em incerta claridade
e ficamos nas paredes do vento
a escorrer para tudo o que ele invade.

Pusemos tantas flores nas horas breves
que secam folhas nas árvores dos dedos.
E ficámos cingidos nas estátuas
a morder-nos na carne dum segredo.

Natália Correia, in "Poemas (1955)"

Deusa Guerreira


Nela reside a alma da guerreira,
da Deusa, da mulher...
aquela que mesmo na dor,
acredita e não desiste.
A santa e a pecadora,
a virgem e a mãe.
Desnuda o corpo,
desvela a alma,
abre o coração,
sente a música das esferas,
escuta o vento...
segue o som das melodias que apenas ela pode ouvir.
Dança sempre:
à chuva, ao sol,
no fogo.
Pelo fogo que em si reside.
Ela é a chama que arde.
as ondas que batem na rocha.
o vento que levanta o cabelo.
a terra sólida em que se sustenta.
Acolhe os sentimentos,
cultiva lealdades,
chora em silêncio, por trás da sua armadura
e sorri para o mundo e para a vida...
canta alto o seu coração,
transforma sonhos em realidades,
desafia transitoriedades,
desafia a própria morte
porque renasce em si mesma:
cada vez mais forte
cada dia mais tenaz.
E prevalece.
Mesmo em silêncio
faz ouvir aos mundos os seus hinos,
céus e terra ouvirão seus chamamentos...
SLL

Acção



Agir não fazendo
Nada! 
Prefiro querer o nada 
Do que nada querer! 
Falar com todo este 
Silêncio! 
Mexer-me sem o corpo 
Mover! 
Olhar o pôr do sol 
E aquecer o ânimo 
Cheirar o imenso mar 
E inundar a alma 
Sentir o vento no rosto
A acariciar-me as faces 
Como a vida é bela 
Sem que para isso nada 
Façamos! 
Quer queiras quer não 
É esta também a minha actuação!

Faze Araújo

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Sonhos



Vive a tua verdade sem abrir mão dos teus sonhos
sem perder a tua magia
todos nós somos magos
arquitectos do nosso universo pessoal
no fundo
os anseios de coração, são escutados
pelas forças supremas que regem o universo
e ao sonharmos
indicamos a direcção que desejamos seguir
em outros planos
começam a traçar-se as linhas dos nossos sonhos
cabe-nos plasmá-las na realidade diária
vivendo como sonhamos.
Há algo que nada nem ninguém nos pode tirar:
a possibilidade de fechar os olhos e voar
com a alma leve e ligeira
para mundos que apenas nós conhecemos,
para sítios por nós criados,
para diálogos ansiados...


Vive a tua verdade sem abrir mão dos teus sonhos
porque "o sonho comanda a vida"
escuta o teu coração
silencia a tua mente
e deixa que flua a vida que tens em ti.
Somos co-criadores da realidade em que vivemos,
aprendamos a moldá-la
Quanto mais te elevas, sonhando
mais alto voarás.

Não te esqueças
que és um Filho do Universo.


SLL

Foto de Sara Lourenço